Rent the Runway e o Modelo de Economia Compartilhada na Moda

Rent the Runway e o Modelo de Economia Compartilhada na Moda

August 22, 20258 min read

A Rent the Runway não é apenas uma empresa de aluguel de roupas - ela representa uma revolução silenciosa no paradigma de consumo de moda, pioneira em transformar vestir-se de um ato de propriedade em uma experiência de acesso. Com receita anual de US$ 306,2 milhões em 2025 e 147.157 assinantes ativos, a marca estabeleceu-se como líder indiscutível no mercado global de aluguel de moda online, que cresceu de US$ 1,9 bilhão em 2024 para projeção de US$ 3,6 bilhões em 2033.

Este modelo disruptivo não representa apenas uma alternativa de consumo, mas uma resposta direta à crise ambiental da fast fashion e uma proposta radical de economia circular aplicada ao vestuário. Ao definir como meta "estabelecer o padrão para a moda sustentável", a Rent the Runway demonstra como a economia compartilhada pode reconciliar crescimento de receita com responsabilidade ambiental - um feito que parecia impossível na indústria da moda tradicional.

O Império da Economia Compartilhada na Moda


O mercado global de aluguel de roupas online foi avaliado em US$ 2,4 bilhões em 2024 e deve atingir US$ 4,9 bilhões até 2033, demonstrando crescimento anual composto (CAGR) de 9,2%. Esta expansão é impulsionada por mudanças comportamentais profundas: millennials preferem vestir roupas de grife sem possuí-las para acompanhar tendências em constante evolução.

O modelo de assinatura domina o mercado, representando 65% de todas as subscrições de moda, seguido por assinaturas trimestrais com 25%. 45% dos assinantes permanecem fiéis ao serviço por mais de um ano, indicando forte retenção e satisfação do cliente.

Rent the Runway: Pioneirismo e Liderança


A Rent the Runway registrou o "crescimento sequencial mais rápido de assinantes ativos no Q1 versus Q4 dos últimos quatro anos", com implementação de estratégia agressiva de aquisição de inventário resultando em aumento de 24% nas recebimentos de novo inventário no Q1 2025 versus Q1 2024.

A empresa lançou 36 novas marcas e mais de 1.000 novos estilos no primeiro trimestre de 2025, com expectativa de lançar mais de 40 novas marcas e mais de 2.700 novos estilos ao longo do ano. A CEO Jennifer Hyman declarou: "Tenho convicção de que os resultados deste trimestre provam que nosso foco em transformar nosso inventário está funcionando".


Estratégia de Impacto: Redefinindo Sustentabilidade


A Rent the Runway assumiu compromissos ESG sem precedentes na indústria da moda: 100% das emissões de carbono dos locatários são compensadas, meta de emissões líquidas zero até 2040 para operações próprias e objetivo de retirar 500.000 peças de vestuário da produção até 2026.

Anushka Salinas, presidente e COO, explicou: "Queríamos ir além dos compromissos típicos que você vê nas marcas. Queríamos destacar objetivos específicos em relação à movimentação de roupas". Os resultados da Avaliação do Ciclo de Vida (LCA) mostraram que a Rent the Runway deslocou ou poupou 1,3 milhão de peças de roupa novas da produção desde 2010.

Modelo de Negócio Regenerativo


"Para que a maioria das empresas da indústria da moda cresçam, elas precisam produzir mais. Seus compromissos ESG estão fundamentalmente em desacordo com os resultados financeiros. Para nós, somos uma das poucas empresas que realmente incentiva as pessoas a comprar menos e usar mais", afirmou Salinas.

A empresa realizou 4,1 milhões de reparos de roupas em junho de 2021 para prolongar a vida útil das peças de aluguel, demonstrando como economia circular pode ser operacionalizada em escala industrial.


Impactos Ambientais Mensuráveis

Uma peça alugada pode ser usada por até 30 pessoas antes de ser descartada, enquanto uma peça comprada frequentemente fica esquecida no armário. Segundo a ONU, a indústria da moda é responsável por 10% das emissões globais de carbono, e o aluguel reduz significativamente este impacto ao ampliar o ciclo de vida das peças.

Na Suécia, mais de 90% do impacto climático das roupas ocorre na compra de peças novas. Pesquisa revelou que 70% das emissões da moda ocorrem antes da peça chegar ao consumidor, demonstrando que reduzir o consumo através do aluguel é medida urgente e eficaz.

Economia Circular em Ação


A economia compartilhada alinha-se com a economia circular ao encorajar reutilização e reaproveitamento de bens e materiais. Menos de 1% de todos os têxteis mundialmente são reciclados em novos produtos, enquanto a União Europeia descarta 5 milhões de toneladas de roupas por ano.


O aluguel de roupas proporciona maior disponibilidade a vários consumidores que podem colaborar com a redução do uso de recursos naturais e do descarte de resíduos têxteis, criando verdadeiro modelo de economia circular aplicado.


Cenário Brasileiro: Startups Pioneiras


A Clorent, marketplace virtual fundado pelas estudantes Eduarda Ferraz e Ana Teresa Saad da FGV, representa nova geração de empreendedores brasileiros abraçando economia compartilhada. A plataforma reúne cerca de 1.500 peças entre roupas, sapatos e bolsas, oferecendo consumo de moda ecologicamente e economicamente consciente.


"O Clorent vem com a ideia de ter peças interessantes para todas as ocasiões, desde uma festa no final de semana até uma reunião de trabalho ou baile de formatura", explicou Ana Teresa Saad.


Lord's Trajes: Economia Masculina


Pedro Bagatini Guerra, diretor fundador da Lord's Trajes, revela que o aluguel oferece economia de até quatro vezes em comparação com compra de roupas novas. O valor do aluguel varia de R$ 390 a R$ 890, tornando moda de qualidade acessível para consumidores que não podem ou não querem investir em peças de alto valor.


Mercado Brasileiro em Expansão


Pesquisa com 597 consumidores brasileiros revelou propensão significativa para aceitação da moda compartilhada, embora identificou-se discrepância entre intenção declarada e comportamento prático. Mesmo grandes grupos de consumidores já demonstraram abertura para modelos colaborativos como armários compartilhados.


Desafios e Complexidades do Modelo


Estudo finlandês publicado na Environmental Research Letters causou controvérsia ao sugerir que aluguel de roupas pode ser pior para o meio ambiente que descarte, devido a transporte para diversos clientes, custos de embalagem e lavagem a seco entre entregas. Contudo, críticos argumentam que o estudo não considerou o ciclo completo de impactos.


Pesquisadores suecos destacaram que o maior problema está na produção: 70% das emissões ocorrem antes da peça chegar ao consumidor, sugerindo que qualquer medida que reduza produção nova tem impacto positivo líquido.


Viabilidade Econômica e Escalabilidade


Pesquisa com nove empresas suecas identificou dificuldades em alcançar viabilidade econômica, incluindo altos custos de armazenagem, transporte e lavanderia. Startups relataram obstáculos para atrair capital de risco, especialmente nos primeiros anos.


Os modelos mais bem-sucedidos atuaram em segmentos específicos com conexão territorial, como estações de esqui ou áreas de lazer, sugerindo que especialização e localização são fatores críticos de sucesso.


Tecnologia e Personalização


Serviços que utilizam IA avançada e machine learning reportam 30% maior satisfação do cliente comparado aos que usam algoritmos básicos. 70% das empresas de assinatura de moda oferecem serviços de styling online ou recursos de experimentação virtual.


A taxa média de devolução para itens de caixas de assinatura é de 25%, demonstrando necessidade de personalização precisa para atender preferências do cliente.


Influência de Redes Sociais


Quase 40% dos serviços de assinatura de moda colaboraram com influenciadores ou celebridades para criar coleções exclusivas. O crescimento das redes sociais, com 4,8 bilhões de usuários globalmente, fornece oportunidades massivas para promoção de marca e engajamento.


Perspectivas Futuras e Transformação Setorial


Especialistas preveem que em 10 anos o segmento de aluguel de roupas ultrapassará o fast fashion. Dados da Global Data Retail mostram que o mercado faturou US$ 1 bilhão em 2021 e deve ultrapassar US$ 2,5 bilhões em 2023. Future Market Insights projeta crescimento de 11% nos próximos 10 anos.


Até 2033, ter guarda-roupa enxuto com peças alugadas será tão comum quanto usar streaming atualmente, representando mudança cultural fundamental na relação com propriedade.


Modelos Circulares Emergentes


A Ellen MacArthur Foundation identificou três modelos circulares principais: plataformas de revenda e aluguel (ThredUP, Rent the Runway), marcas circulares (Mud Jeans) e sistemas de take-back. O objetivo é desacoplar receita da produção, abordando desafio central da transição econômica.


Menos de 0,5% do mercado global de fibras veio de têxteis reciclados em 2020, demonstrando potencial massivo para crescimento de modelos circulares.


Transformação Cultural e Comportamental


O modelo de economia compartilhada fundamenta-se em acesso sobre propriedade, promovendo interações peer-to-peer sem intermediários tradicionais e otimização de recursos subutilizados. Esta transformação alinha-se com valores da Geração Z, que prioriza sustentabilidade sobre acumulação material.


"A palavra-chave é serviço" - a moda compartilhada transcende simples aluguel para incluir styling, expedição, manutenção e limpeza, criando ecossistema completo de experiência de moda.


Consciência Ambiental como Motor


Mais de 60% dos consumidores preferem serviços de assinatura que oferecem embalagens sustentáveis e ecológicas, refletindo crescente consciência ambiental. A crescente consciência sobre sustentabilidade, combinada com awareness sobre efeitos ambientais positivos de compartilhar e reutilizar roupas, influencia positivamente o crescimento do mercado.


Conclusão: Redefinindo o Futuro da Moda

A Rent the Runway e o modelo de economia compartilhada representam mais do que inovação empresarial - simbolizam uma reconfiguração fundamental da relação entre consumo, sustentabilidade e crescimento econômico. Com mercado projetado para crescer de US$ 1,9 bilhão em 2024 para US$ 3,6 bilhões em 2033, o aluguel de moda demonstra que modelos circulares não são apenas ambientalmente necessários, mas economicamente viáveis.

A estratégia da Rent the Runway de "incentivar pessoas a comprar menos e usar mais" oferece template replicável para toda indústria da moda. Ao deslocar 1,3 milhão de peças da produção desde 2010 e comprometer-se com neutralidade de carbono até 2040, a empresa prova que crescimento de receita e responsabilidade ambiental não apenas podem coexistir, mas se fortalecem mutuamente.

Para executivos de moda, estilistas e CEOs, a mensagem é inequívoca: o futuro não pertence a quem produz mais, mas a quem otimiza melhor o que já existe. A economia compartilhada na moda não é tendência passageira - é a evolução natural de uma indústria que deve reconciliar criatividade, comercialidade e consciência ambiental.

O modelo disruptivo do aluguel está redefinindo não apenas como compramos roupas, mas como concebemos propriedade, sustentabilidade e sucesso empresarial no século XXI. A era da moda como serviço chegou definitivamente - e empresas que abraçam esta transformação não apenas sobrevivem, mas prosperam como líderes de uma nova economia da moda.

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