“Offline não morreu”: por que as lojas físicas seguem essenciais na moda (e como integrá-las ao online)

“Offline não morreu”: por que as lojas físicas seguem essenciais na moda (e como integrá-las ao online)

October 08, 20254 min read

Por João Risoleo, CEO da uMode

Falo como quem trabalha com empresas do varejo de moda todos os dias: a loja física não é um resquício do passado; ela é o motor que, conectado ao digital, acelera descoberta, experimentação e entrega. A notícia da semana ajuda a provar o ponto: a Shein, nascida 100% online, anunciou seis lojas permanentes na França, começando pelo BHV Marais, em Paris, e seguindo para Dijon, Reims, Grenoble, Angers e Limoges. O próprio comunicado fala em revitalizar centros urbanos e cita a criação de cerca de 200 empregos.

O que a loja entrega que o site não resolve sozinho

Na prática, a jornada de compra ficou híbrida. Quando medimos comportamento real, o cliente que usa vários canais (pesquisa online, visita loja, compra no app…) gasta mais do que quem usa um canal só. Em um estudo com 46 mil consumidores, o gasto cresceu à medida que os canais aumentaram. Ou seja: loja e e-commerce se potencializam, não se canibalizam.

Outro ponto que raramente entra na conversa: devoluções. Em 2024, o varejo americano projetou US$ 890 bilhões em itens devolvidos (16,9% das vendas). As taxas online são mais altas do que a média, ou seja, provar na loja, ajustar tamanho e resolver dúvidas antes da compra ajuda a derrubar custo e atrito. Transformar a loja em hub de troca ágil também reduz “volta” de mercadoria pelo correio.

Métrica simples para quem decide: conversão

No digital, a moda costuma converter em 2%–3% (varia por nicho; mulheres geralmente convertem mais do que homens, acessórios convertem ainda melhor). Em loja física, a conversão é de dois dígitos na maioria dos formatos, frequentemente na casa de 20%– 40%. Em linguagem direta: um fluxo menor, mas muito mais gente saindo com sacola. Use esse contraste para desenhar o papel de cada canal.

Por que a Shein foi ao físico (e o que executivos podem copiar)

  1. Vitrine de massa pronta. Estar no BHV Marais dá audiência imediata, PR e prova social. Você entra no mapa de quem passeia, fotografa e indica. Pense em endereços que já são mídia na sua praça.

  2. Ajuste fino de sortimento. O físico revela, em dias, o que veste bem, onde e para quem. O online sozinho enxerga clique; a cabine mostra caimento e dúvida real (barra, modelagem, tecido).

  3. Fulfillment inteligente. A loja vira mini-CD: retirada do pedido (BOPIS), troca rápida e até despacho a partir da loja mais próxima, encurtando prazo e frete. Boa parte dos clientes compra algo a mais quando vai retirar.

  4. Comunidade e conteúdo. Eventos, lançamentos, creators locais — a loja vira estúdio ao vivo que alimenta o social e traz tráfego de volta ao site.

Como eu explico para conselho e diretoria

  • Defina o papel da loja por praça. Algumas serão showroom/experiência, outras hub de retirada e troca, outras geradoras de tráfego (flagship). Escreva isso em uma linha para cada unidade.

  • Conecte estoques e pedidos. Mostrar estoque de loja no site e roteirizar o pedido pelo ponto mais próximo reduz prazo e quebra a objeção do frete. É o básico do omnichannel bem-feito.

  • Meça o que importa no híbrido.
    • Conversão da loja (visitantes → compras).
    • % de pedidos atendidos por loja (retirada e ship-from-store).
    • Devolução por canal (busque cair no online ao ativar prova/ajuste na loja).
    • “Compra extra” na retirada (quanto a visita de BOPIS adiciona ao ticket).

Treine o time para o novo fluxo. Balcão de retirada não é “fila de caixa”; é ponto de relacionamento com roteiro de sugestão e solução de dúvidas.

“Mas o online não vai matar as lojas?”

Essa frase ignora o dado mais consistente da última década: o cliente compra nos dois, muitas vezes no mesmo dia. Pesquisas recentes mostram que o físico influencia uma parte relevante das vendas digitais (gente que viu, provou ou retirou na loja e fechou no mobile). Em períodos de pico, o híbrido domina: pesquisar online, checar estoque local, passar na loja e finalizar em qualquer canal. É exatamente por isso que players nativos digitais, como a Shein, estão abrindo portas.


Para levar (e aplicar já)

  • Lojas físicas não são obsoletas; são enganadas quando usamos métrica errada. Troque “vendas por m²” isoladas por indicadores omnichannel (conversão, pedidos atendidos pela loja, redução de devolução online).

  • Escolha 1–2 papéis por unidade e alinhe processos e metas.

  • Comece pequeno: pilote retirada e trocas em 2–3 lojas, exponha estoque local no site, treine o time para oferecer complemento na retirada. Registre o impacto por 12 semanas.

  • Use endereços “mídia” para ganhar awareness rápido (como fez a Shein no BHV).

Se eu pudesse resumir para outros executivos: o online não acabou com a loja, ele deu um novo trabalho para ela. E, quando a gente assume isso de forma estratégica, a loja volta a ser onde tudo se encontra: desejo, prova, serviço e velocidade.

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