
Como o acordo EUA x União Europeia vai impactar a moda de luxo
Estados Unidos e União Europeia chegaram a um acordo crucial para evitar uma guerra comercial que ameaçava desestabilizar setores inteiros, incluindo o de bens de luxo. Como resultado, uma tarifa de importação de 15% foi estabelecida para a maioria dos produtos europeus, afastando por ora a ameaça de tarifas ainda mais agressivas, como os 30% inicialmente ventilados pelo governo americano.
Para as marcas de luxo europeias, como Louis Vuitton, Gucci, Chanel, Hermès e Dior, esse acordo representa um sério desafio, não só econômico, mas estratégico. Isso porque o crescimento dos lucros dessas casas depende amplamente de aumentos de preços agressivos nos últimos anos. Agora, porém, os limites dessa estratégia começam a aparecer.
Expansão dos Preços já Chegou ao Limite?
Desde 2019, o preço médio de produtos de luxo pessoais na Europa aumentou impressionantes 52%. Somente a bolsa classic flap da Chanel subiu 91% desde outubro daquele ano, passando a custar €11.100 em 2025.
Essas altas foram justificadas pela inflação em matérias-primas, custos trabalhistas e esforços para proteger margens diante de crises globais. Porém, a disposição dos consumidores de aceitar novos aumentos mostra sinais claros de esgotamento, especialmente entre os públicos mais jovens e compradores ocasionais.
Analistas do UBS estimam que uma tarifa de 15% forçaria as marcas de luxo a repassar um aumento médio de 2% nos preços para os consumidores americanos e cerca de 1% globalmente, para evitar disparidades regionais de preços.
O Risco de Perder Consumidores
Marcas como Hermès e Kering afirmaram publicamente que poderiam aumentar preços para compensar as tarifas. No entanto, anos de aumentos vigorosos já deixaram pouco espaço para novos ajustes sem riscos de boicote ou migração de clientes para concorrentes.
“As marcas estão sendo cautelosas com mais reajustes para não afastar consumidores jovens e os chamados ‘occasionals’”, destaca Jacques Roizen, do Digital Luxury Group.
Caso as marcas não consigam repassar os custos, o impacto pode reduzir em até 3% o lucro operacional (EBIT) do setor, num segmento que já enfrenta margens comprimidas por demanda enfraquecida globalmente, custos crescentes com sustentabilidade e vendas em queda na China.
Estratégias das Marcas: O que Está em Jogo
Mudança de produção para o território americano é vista como improvável para a maioria das grifes, devido à dependência de savoir-faire europeu e cadeias produtivas artesanais consolidadas em cidades como Florença e Paris. Algumas marcas podem optar por “absorver” parte dos custos para evitar perder relevância, especialmente diante do risco de alienar clientes sensíveis a preços após anos de aumentos seguidos.
Para as menos icônicas ou entre as menores marcas, sobreviver ao aumento de custos sem capacidade de repasse pode significar perda de competitividade ou até saída do mercado americano.
O Consumidor e o Novo Limite de Preço
Consumidores americanos já começaram a demonstrar resistência: “Vou pensar duas vezes antes de comprar, dependendo da tarifa”, afirmou uma cliente da Saks Fifth Avenue em Nova York.
O risco é agravado por um contexto de demanda global moderada, taxas de juros mais altas e inflação persistente, fatores que comprimem o consumo de artigos supérfluos.
Um estudo da KPMG enfatiza que, por mais forte que seja a marca, existe um ponto de inflexão a partir do qual aumentos excessivos expulsam consumidores do universo do luxo tradicional, aproximando-os de marcas “premium” ou grifes mais acessíveis.
Impactos e Perspectivas
As novas tarifas dos EUA impõem um limite concreto à capacidade das marcas de luxo europeias de continuar apostando em aumentos de preços como principal alavanca de crescimento. Em vez disso, as marcas precisarão equilibrar cuidadosamente sua estratégia: proteger margens sem sacrificar paixão, desejo e acesso de novos consumidores.
No curto e médio prazo, a força de marca, desejo por diferenciação e exclusividade ainda garantem algum “colchão” às gigantes do luxo. Mas uma combinação de** ambiente de consumo mais racional, nova pressão tarifária e anos de aumentos agressivos pode acelerar mudanças profundas** na precificação, inovação de produto, relacionamento com clientes e até mesmo na internacionalização da produção.
O setor do luxo, por muito tempo visto como imune a conjunturas, agora se vê forçado a testar, e talvez redefinir, o verdadeiro poder de precificação de suas marcas de elite.